Rotten Apple

Três

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Ao chegar à casa de Dongwoo, sua mãe me recebeu animadamente. Abraçou-me e me deu um beijo no rosto, como fazia desde que comecei a frequentar sua casa. Disse logo que Dongwoo estava em seu quarto com Hoya, que me apressasse para que pudéssemos jogar, e mais tarde ela nos levaria algo para comer.

Subi rapidamente e, antes que entrasse em seu quarto, pus-me a ouvir o que diziam, por trás da porta. Diferente do que esperava, não podia ouvir sequer o ruído do vídeo game. Dongwoo sempre fora bastante barulhento enquanto jogava, o que me soava bem incomum. Girei a maçaneta e abri a porta com cuidado, notando a falta de claridade no cômodo.

Não demorei até localizar o topo de suas cabeças atrás do sofá, tão próximas que pareciam dividir o mesmo corpo. Abri um pouco mais a porta e entrei no quarto, quando Hoya olhou por cima do estofado e sorriu um pouco constrangido, sendo prontamente seguido por Dongwoo.

Como era de se esperar, meu melhor amigo gargalhou seu riso contagiante e alto, fazendo o garoto rir consigo. Eu apenas franzi o cenho, confuso, não sabia por que eles riam daquele jeito.

“Você chegou!” Dongwoo disse, levantando-se. O jogo estava mesmo pausado.

“Sim… Sua mãe disse que vocês estavam aqui. Mas… O que estão jogando?”

“Qualquer coisa. Estávamos só conversando, enquanto te esperávamos.”

“Ok.”

Dei a volta no sofá e me sentei entre eles, meu amigo sentando-se em seguida. O quarto de Dongwoo era bem grande e decorado. Tinha sua estante com TV, vídeo game e livros, um grande sofá de couro negro, algumas prateleiras com os troféus e medalhas que ganhara nas competições de hip-hop da escola, e outras coisas que ele não conseguia se desfazer. Ele adorava juntar objetos que para mim era inúteis, mas para ele poderiam servir a qualquer momento.

Hoya me encarou, suas orelhas vermelhas e os maxilares travados no mesmo sorriso que me dava toda vez que nos víamos, e Dongwoo nos fitavam confuso, os lábios entreabertos, sinal de que estava pensando em algo.

“Então, sobre o que estavam conversando?” Perguntei, desinteressado por fora, borbulhando em curiosidade por dentro.

“Sobre… é…” Disseram em uníssono. Hoya se levantou e pegou os joysticks, Dongwoo acompanhando-o com o olhar. “Estava comentando com ele sobre o garoto novo.”

“Outra vez esse assunto? Se eu falo sobre ele, sou fofoqueiro… mas tudo bem se vocês dois ficarem falando, não é.”

“A diferença é que estávamos falando sobre ele. Você quer logo falar com o cara, e acaba assustando ele.”

“É, hyung… Talvez sua forma de se aproximar não seja a correta.” Hoya disse timidamente, não podia me encarar, como sempre.

“Ah, então acha que tenho que fazer como você fez com Dongwoo?” A pergunta saiu mais intimadora que minha intenção, e Dongwoo engasgou com o ar, não sei, tossia feito um louco, enquanto as orelhas de Hoya se avermelhavam ainda mais.

“Não é isso… Eu e Dongwoo hyung nos aproximamos por causa das aulas de hip-hop. Era um interesse que tínhamos em comum. Não existe nada assim entre você e esse garoto?”

“Se ele abrisse a boca, eu teria certeza de que ele não é mudo ou retardado… Como vou saber dos interesses dele, se ele não fala com ninguém?”

“Não seja tão grosseiro, Sunggyu-ah!” Dongwoo me repreendeu, pegando o joystick e escolhendo o que jogaríamos. “Eu ainda acho que você não soube se aproximar dele. Pessoas caladas podem ser tímidas, se você as expõe, elas não vão se sentir confortáveis pra falar contigo.”

“Tanto faz.” Dei de ombros, tomando o controle da mão de Hoya. “Vocês tão tratando isso como se eu quisesse ser o melhor amigo de infância desse cara. Acalmem seus ânimos.”

“Não está mais aqui quem falou.” Hoya disse, levantando-se, indo em direção ao corredor.

“Pare de ser tão rude com o garoto! Não trate assim seus dongsaengs!” Dongwoo cochichou, uma expressão não tão amigável em seu rosto. “Já disse que não tem pra que ter esse ciúme todo, mas parece que você não confia em mim.”

“Qual é o lance de vocês, por que não me conta? Assim fica mais fácil pra eu entender se devo ou não me incomodar.”

“É que a gente…”

Dongwoo afastou-se e abriu o menu do jogo assim que sua mãe entrou com uma bandeja em mãos, acompanhada de Hoya. Ela nos sorriu e deixou a comida sobre a mesa de centro, abrindo a janela em seguida. “Não entendo por que vocês ficam no escuro, não entendo mesmo!” Ressonou, afastando as cortinas azuis escuras e deixando o quarto em seguida.

Fitei Hoya, que nos servia, tentando entender por que suas orelhas permaneciam vermelhas, como se algo o incomodasse sobremaneira.

Talvez Dongwoo tivesse razão, e meu ciúme fosse realmente infundado. Eu estava ali, entre eles, jogando com meu melhor amigo e comendo o melhor bolo de fubá que algum dia havia provado. Se Hoya fosse o típico ladrão de amigos, ele não concordaria em me chamar. Mas algo ainda me soava estranho, e eu iria descobrir.

Jogamos até as oito da noite e, antes que eu e Hoya fossemos embora, a senhora Jang nos preparou um jantar maravilhoso. Confesso que após aquela tarde – e todas as vezes que ganhei do garoto –, passei a simpatizar mais com ele.  Hoya não era um garoto mal. Era só um garoto.

Conversamos um pouco mais sobre os trabalhos da escola, sobre as competições que em breve aconteceriam, e os dois me disseram que estavam trabalhando em um dueto de b-boy e rap, motivo pelo qual sempre estavam juntos. Se eu ao menos fosse bom nisso, poderia ajudá-los.

No caminho de volta para casa, me peguei pensando outra vez sobre o que vira mais cedo. Não fosse por minha personalidade insistente e inquieta, começaria a odiar tais lembranças.

Sempre fora o tipo que desistia de tudo muito rápido. Se alguém não demonstrasse interesse por mim, em qualquer que fosse o aspecto, eu logo partia para outras amizades e conquistas. Não era como se eu desejasse conquistar o garoto, eu só me sentia incomodado a cada vez que o via com aquele olhar distante, triste. Era como se algo me dissesse que ele precisava da minha ajuda, e a parte mais inquietante de tudo, era o fato de eu nunca antes me sentir assim.

Diminuí a velocidade de meus passos e fitei o céu. As estrelas estavam escondidas atrás de nuvens densas, sinal de que poderia chover a qualquer momento. De certa forma aquele cenário me deixava oprimido, sensibilizado por algo que não sabia definir.

Parei no meio da calçada, e observei o céu, atentamente. Tentava, de todas as maneiras possíveis, tirar da minha mente aquele olhar. Talvez o meu, naquele exato momento, fosse parecido consigo. Distante, frio, vazio. A diferença, quem sabe, fosse os motivos que nos levavam a ficar daquele jeito.

Eu só estava curioso e preocupado, nervoso por não conseguir ao menos ter uma conversa amigável. Mas, o que seria capaz de esvaziar os olhos de Nam Woohyun?

Suspirei em negação, e segui meu caminho pelas ruas vazias de Seul. Queria chegar logo em casa, escapar da chuva que parecia cada vez mais próxima, descansar e me preparar para mais um dia de aulas exaustivas e tentativas frustradas de aproximação, quando noto, há alguns metros, os mesmos olhos frios.

Woohyun estava encostado no muro de uma casa grande e bonita, observando o céu da mesma forma que observara horas atrás. Tentei, inutilmente, não me sentir nervoso. Eu não poderia simplesmente parar no meio da calçada e dar a volta, aquele era o caminho para minha casa. Não sabia se olharia para ele, se o cumprimentaria verbalmente, ou apenas passaria por ele como se fosse um desconhecido.

Mas eu ainda era seu colega de classe. O insistente colega que estava fazendo o trabalho de história consigo. Me perguntei se ele se irritaria por eu saber onde ele mora, se aquela era mesmo sua casa, e segui meus passos, na mesma velocidade de antes.

Quando me aproximei, o vi mirar em minha direção, os olhos presos em meu rosto. A cada passo, sentia o coração estremecer, numa sensação totalmente nova, indescritível, confusa. Woohyun olhava diretamente em meus olhos, as íris úmidas dizendo mil palavras que eu não sabia interpretar. Um nó apertou minha garganta, como se uma mão tentasse me roubar o ar, e eu não sabia dizer se essa mão era a alma de Woohyun, materializando-se através daquele olhar.

Eu não tinha qualquer reação. Meus lábios deram forma a um sorriso torto quando eu me aproximei dele. Ele, no entanto, não demonstrara qualquer reação. Sabia que ele me fitava, pois quando passei por ele, seu rosto acompanhou o meu. Não havia qualquer sinal de sorriso em sua face. Tampouco tristeza, angustia, confusão. Tudo o que eu podia ver, era vazio. Um eco que reverberava dentro de mim, e repetia insistentemente: ele precisa de você. Não desista dele.

Quando já estava distante, olhei para trás. Woohyun já não estava lá. Tampouco as nuvens. Era estranho, mas as estrelas despontavam brilhantes no céu, como se um sopro levasse consigo as nuvens pesadas, carregadas de chuva.

Mas a ausência delas não me livrara de minha confusão. Tampouco da voz que ainda ecoava dentro de mim, avisando-me algo que eu não sabia entender.

Será que ele realmente precisava de mim? O que poderia deixá-lo tão triste? Por mais que me parecesse impossível, eu iria descobrir.

 

Eu era o primeiro a chegar a nossa sala. Me sentia um estúpido, sentado em minha carteira, esperando que alguma alma viva aparecesse. A noite anterior havia sido bastante esquisita; eu sonhara com coisas que não conseguia entender, e, quando o sonho se tornou um pesadelo, já não conseguia mais dormir.

Segurava os livros que havia encontrado, anotava algumas coisas em meu caderno, e logo ouvi os risos de Dongwoo se aproximarem da porta. Lá estava meu melhor amigo, sorridente e radiante como sempre fora, acompanhado de seu amigo. Eles se cumprimentaram como de costume, Hoya sorriu e acenou para mim, e se perdeu entre os corredores.

“E aí, Gyunie, como está?” Jogou-se em sua cadeira, a mochila pesada era abandonada ao seu lado. “Acordou com as galinhas? Você nunca chega cedo.”

“Você também não.”

“Hoya veio com os outros caras do grupo de hip-hop e passou em casa… Se a sua não fosse tão longe, passaríamos lá também. Mas me diz, o que houve? Por que essa cara?”

“Pesadelo… Não dormi essa noite.”

“Algo em especial?” Ele perguntou, tirando os cadernos da mochila.

“Eu também queria saber. Parece que to cheio de pressentimentos.”

“Não quer conversar?” Ofereceu, me dando uma de suas barras de cereal.

“Ah cara… Eu não sei, mas acho que tem algo errado…” Emudeci-me assim que vi Woohyun entrar. Ele sabia que eu estava ali, mas diferente da noite anterior, não me fitou. Ele sequer desviou seu olhar em nossa direção, e nós nos sentávamos ao seu lado.

“Bom dia, Nam. Beleza?” Dongwoo tentou quebrar o gelo, mas ele ao menos se moveu para nos cumprimentar.

“Deixa pra lá, cara. Não vamos forçar ele.” Disse, deixando os livros de história a mostra.

“Tem certeza? Você que queria tanto se aproximar do novato.”

“Eu já tenho um amigo, e ele está aqui na minha frente.” Sorri para Dongwoo, e ele me ofereceu a mão, para que eu batesse. Meu melhor amigo não falhava em me apoiar, mesmo quando tal apoio fosse apenas deixar estar.

Faltava pouco para que eu completasse dezessete anos, mas já havia aprendido que nem tudo o que queremos na vida, nos será possível. Eu tinha duas opções: uma delas, a mais fácil, era deixar que as coisas acontecessem da forma que deveriam acontecer. Só não conseguia entender claramente o motivo de me sentir daquela forma, por causa de um garoto.

O primeiro período fora tranquilo, assim como o intervalo e o segundo período. Quando chegava ao final da última aula – biologia –,Woohyun tocou minha mesa com a ponta do lápis, chamando minha atenção. O fitei, mas ele não se atrevia a olhar nos meus olhos. Parecia incomodado com ago, como se o fato de havê-lo visto na noite anterior fosse algum tipo de empecilho.

“Vi que trouxe os livros…” Ah, ele finalmente admitia haver olhado em minha direção, mesmo que não diretamente. “Conseguiu encontrar tudo o que pedi?”

Woohyun havia falado comigo. Ele. Ele havia tomado a iniciativa e puxado assunto. Era apenas sobre o trabalho, mas significava que ele não estava tão fechado, a ponto de não perguntar. Me sentia perdido, observando sua expressão séria, quando o ouço outra vez.

“Achou?”

“Ah… O que você pediu.”

“Achou ou não?” Insistiu, parecia nervoso. Era como se cada palavra que saísse de sua boca fosse preciosa demais para gastá-las com um louco que se sentava ao seu lado.

“Sim, sim… Achei alguns títulos, o outro eu vou procurar mais tarde na biblioteca. Se quiser, podemos fazer o trabalho juntos. O que acha?”

“Não posso.” Respondeu rispidamente, encarando Dongwoo, que mantinha sua expressão congelada enquanto olhava de volta.

“Tudo bem. Eu vou pesquisar e amanhã conversamos sobre o trabalho na aula de história.”

“Ok, combinado.”

Woohyun curvou-se, como se agradecesse, e voltou a observar a lousa. Dongwoo me encarava confuso, como se aquilo tudo fosse irreal demais para tratar como uma conversa normal entre alunos. Ele sabia que aquele não era o momento certo para perguntar alguma coisa, mas eu sabia que seria bombardeado por ele em alguns minutos.

Pela primeira vez em alguns meses, eu me sentia melhor. Ele havia falado comigo. Eu mal podia acreditar.

2 opiniões sobre “Rotten Apple

  1. Suuuuuuuuz OMG OMG OMG QUE CAP FOI ESSE U_U! Simplesmente perfeito plmdds
    Estou amando o desenrolar desta história DongWoo e Hoya eles precisam se entender logo ! E Gyu finalmente está aceitando o Hoya gostei até porque neah vai ter briga quando esses dois se juntar e no pode >_<
    Vamos a parte que eu mais amei o que foi aquela ameaça de temporal mas que na verdade era do o encontro do Woo com o Gyu meu aquilo foi divino Woo parece que sabia que ele estava a um passo desistir nossa fiquei
    besta com isso e emoçãoque você colocou ali me arrepiou tanto que eu falei não desiste dele não Gyu e Ai eu estou tão curiosa pra saber o que acontece com o Woo que ando tendo coisas ele deve ter sido destruído pra ter um comportamento assim (isso é tudo impressão minha) e ok… AAAAAAAAAAAAHHHHHHH PARA O MUNDO QUE O WOO ABRIU A BOCA PRA FALAR COM O MEU AMOOOR GYU OIOIOI pensei que isso nunca nessa vida ia acontecer kekekeke to di brinks claro que vai porém neah tinha que surtar. BOM Suz Fico por aqui nos meus surtos e você como sempre está de parabéns por sua nova fic que eu vou amar e surtar fico muito feliz por você ter se lançado a escrever outros grupos você é brilhante! Obrigada por nos dar a chance de ler suas histórias adoro você minha diva~♥~
    Até a próxima bju *_*

  2. Yadong cheio das ‘çaliensias’ Adoro, ai coitado o Woo, sei bem como ele se sente, sou assim também, se acho que estão me deixando de lado ou escondendo algo de mim.

    Adorei essa fala ‘Se ele abrisse a boca, eu teria certeza de que ele não é mudo ou retardado’ mas gente, mas gente, o garoto esta mesmo interessado no menino novo…

    Ufa, eles conversaram, tenho que dizer o quanto acho isso importante? O primeiro contato, aquela timidez, aquele frio na barriga, o alívio do Gyu ficou tão claro ali, parece que mil quilos sairam de suas costas… e das minhas, porque não?

    Woo é minha criança linda, que quero pegar no colo e não deixar que nada de mal aconteça, a sua tristeza é quase a minha tristeza… E para um primeiro contato, ele pode até soar grosso se não tivesse momentos de tristeza no olhar…

    Já falei que adoro mandar review no blog??? Eu acho tão lindo e tão mágico, é bem menos poluido do que no AS e essa letra em itálico me encanta *-*

Que tal mandar um alô pra tia Suz? xD