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Vinte

“Vocês chegaram muito cedo!” Dongwoo gritou assim que eu saí da piscina e, quando olhei, Woohyun estava sentado na arquibancada. Lancei um olhar assassino, e meu melhor amigo logo notou. Ele havia estragado tudo.

“Eu, mais que ninguém, preciso treinar bastante.” Me defendi, me sentando ao lado de Woohyun. Só quando ele me fitou, percebi que estava tremendo.

“Entendo.” Dongwoo se sentou entre nós e jogou a mochila no chão. “Que sorte que este é o ultimo sábado de treinamento.”

“Como assim? Não teremos o sábado que vem?” Perguntei num misto de confusão e desespero, não imaginava que já terminaríamos tudo. Eu esperava passar mais um sábado ao lado de Woohyun.

“A competição começa em duas semanas, Gyu…” Woohyun disse, levantando-se em seguida.

“É, e nós vamos treinar na piscina durante a próxima semana, e no sábado que vem eles começam a fazer os preparativos, organizar o ginásio e tudo mais. Não vai dar pra treinar.” Hoonye deu de ombros, seguindo em direção ao vestiário. Woohyun, ainda em silêncio, levantou-se e o seguiu. Dongwoo acompanhou os dois com os olhos, e assim que não podia mais ver eles, me cutucou.

“Você não está raciocinando, Kim Sunggyu!”

“Do que você tá falando?” Me fiz de desentendido, mas já havia notado que ele viu mais que o necessário.

“Você estava prestes a beijar o Namu… Isso é… Muito errado!” Ele sussurrou, me batendo na cabeça.

“Errado por quê? Ele não parecia incomodado.”

“Vai ver ele nem percebeu.”

“Nós estávamos nos olhando, Dongwoo… Nos olhos!” Arregalei os meus, e ele riu. Dongwoo era um idiota mesmo.

“Claro, ainda bem que estavam se olhando nos olhos e não nos dentes.” Desta vez, eu quem bati em sua cabeça.

“O que tenho que fazer então?”

“Você ainda não sabe se ele gosta de garotos também. Se ele for hetero, vai ficar muito estranho o clima depois.” Ele vigiava a porta, certificando-se de que eles ainda não estavam perto.

“Mas ele agiu tão naturalmente quando falamos sobre você e Hoya.”

“Você me contou… Mas ele não ser homofóbico não significa que ele seja gay. Tem que perceber os sinais.” Dongwoo elaborou, falando como se fosse uma espécie de tutor quando o assunto era beijo.

“Que sinais?”

“O jeito que ele olha, que fala, que age contigo. É o que chamamos de clima, se ele não existe, é melhor não tentar algo brusco. Com Hoya foi assim… Eu esperei tanto por um beijo, procurei ficar sozinho com ele na sala de prática, mas nós nos aproximamos primeiro, pra depois rolar. E foi ele quem deu o primeiro passo… Isso porque eu achava que ele era hetero.”

“E por que achava isso?”

“Ele vivia me perguntando por que não tinha namorada; coisas assim.”

“Mas ele te beijou!” Disse alto demais, e Dongwoo colocou a mão em minha boca, me calando.

“Shh Sunggyu, não seja um imbecil! Ele me beijou, mas depois tudo ficou estranho, então não é assim tão simples. Você tem que sentir o momento. Agora fica quieto porque eles estão vindo.”

Hoonye e Woohyun se aproximavam, imersos numa conversa que parecia séria demais para Woohyun – então me lembrei que Hoonye era quieto o bastante para não ser o tipo que embarcaria nas graças de Woohyun. Este, por sua vez, não conseguia me encarar.

O maldito clima. Como eu saberia qual era o momento certo?

Antes que o treino terminasse, Hoya apareceu no ginásio, como era de se esperar. Depois de muita discussão e alguns conselhos, ele percebera que era melhor não sair agarrando Dongwoo por aí, já que Hoonye era capaz de contar tudo ao diretor e fazê-lo pôr os dois em suspensão. Hoonye era o tipo de aluno religioso ao extremo, que não aprovava namoricos entre meninos e meninas, um namorico gay seria capaz de fazê-lo exorcizar Hoya e Dongwoo.

Howon nos acompanhou até o vestiário quando a professora disse que bastava por aquele dia, e desatou a falar. Sobre seu próprio treino, sobre a ansiedade que sentia, porque os professores de sua sala o convidaram para apresentar com Dongwoo o mesmo numero que apresentaram na competição de meses atrás. Meu melhor amigo quase saiu da cabine da ducha ainda sem roupa, apenas para abraçá-lo e comemorar – o barulho que ele fez, no entanto, parecia maior que se ele houvesse saído.

Quando terminamos, Woohyun parecia mais tranquilo. Como ele ficava lindo sem o uniforme da escola! Vestia uma polo salmão e jeans escuros, allstar e os cabelos levemente bagunçados, o que o deixava ainda mais atraente. Todos olhamos para ele, e ele devolveu o olhar, um pouco surpreso.

“O que foi, nunca viram?” Ele praticamente rosnou, nos olhando de soslaio.

“Na verdade, não… Nunca te vimos assim, Namu. Acho que vou ter que mudar seu apelido pra Namstar. Tá parecendo um artista.” Dongwoo brincou e todos riram, inclusive o próprio Woohyun.

“Eu vou almoçar fora, depois de meses! Tudo bem que é com meus pais, mas pelo menos não é em casa, sozinho.” Ele disse tranquilamente, enquanto se olhava no grande espelho. Tirou da mochila um frasco de perfume e, quando o borrifou em seu pescoço, senti cada um dos pelos de meu corpo se eriçar.

“Que ótima essa notícia, Namu!” Não me contive, estava tão feliz que finalmente ele parecia ter um momento legal com sua família, que tinha que expressar de alguma forma.

“Obrigado, Gyu!” Ele me olhou por sobre o ombro e, se antes todos os pelos de meu corpo estavam eriçados, desta vez minha alma estava prestes a abandonar-me.

Sorri sem jeito, e Hoonye meneou a cabeça, dando adeus a nós antes que pudéssemos terminar a conversa – ele nunca estava interessado nelas, de qualquer forma. Dongwoo ajeitou a mochila nas costas e Hoya se aproximou para ajeitar os fios da franja dele. Woohyun os observava através do reflexo do espelho, e eu tentava ler o que estava por trás daquele olhar. Eu era leigo demais para conseguir detectar algo, mas meus instintos me diziam que aquilo se tratava de uma pitada de ciúme.

“Bem, se me dão licença, vou sair antes que minha mãe se irrite e entre. Bom final de semana pra vocês.” Ele se despediu, sorrindo para mim. Um sorriso que eu não sabia interpretar – e temia interpretar da forma errada. Chocou suas mãos contra as de Hoya e abraçou Dongwoo antes de sair, acenando enquanto passava pela porta.

“O que foi aquilo?” Finalmente conseguia respirar, e me sentei em um dos bancos. Hoya riu e Dongwoo o acompanhou.

“Você é tão virgem, Sunggyu!” Dongwoo debochou e passou as mãos pelo quadril de Hoya, os dedos embrenhando os passantes do cinto.

“Dinowoo fala assim, mas quando eu te beijei, você agiu da mesma forma.”

“Eu te beijei de volta! Você é que não sabia como reagir e me deixou confuso.”

“Parem de falar sobre o que vocês já sabem… Me ajudem!” Me irritei, levantando-me em seguida. Peguei minha mochila e Hoya me fitou, eu podia ver compaixão em seus olhos, e não me agradava muito com aquilo.

“É o que eu disse, Gyu, você tem que sentir se vai ou não acontecer. Não aja precipitadamente.”

“Você não viu o jeito que ele acabou de olhar pra mim?” Reclamei, e Dongwoo meneou a cabeça negativamente.

“Hyung, esqueça Woohyun por um segundo, tenho novidades.” Esquecer Woohyun por um segundo? Como se eu já não tivesse tentado. “Sungjong disse que tem uma festinha no karaokê hoje à noite, e convidou a gente.”

“Você e esse moleque de novo, Howon!” Dongwoo explodiu e até eu me assustei ao ouvi-lo chamar Hoya pelo nome.

“Eu já disse que só me aproximei dele pra ajudar o hyung, Dongwoo, não sei por que nós temos que passar por isso de novo!” Hoya parecia tenso, se afastou de Dongwoo e o fitou incrédulo, como se aquela desconfiança fosse um insulto.

“Vocês estão bem? Se for um problema não precisamos ir.” Disse, preocupado com aqueles dois. Por mais que parecessem bem, nada era bom quando Dongwoo se irritava – ele nunca se irritava.

“Não, hyung. Não tem problema algum. Eu já disse pra ele que esse ciúme é inútil, mas ele não se toca. Nós vamos ao karaokê e vamos nos divertir. Não vamos, Dongdong?” Ele acariciou o rosto do namorado, mas não teve ao menos um sorriso de volta.

“Fazer o quê?”

“Dongwoo, seja mais sensato. Você não é assim.” Me arrependi assim que disse aquilo, já que sua expressão não era das melhores.

“Vocês vão ter sua diversão hoje à noite…”

Dongwoo saiu sem esperar Hoya, e o garoto me fitou desapontado. O olhar triste daquele a quem eu não nutria qualquer simpatia no começo me entristecia da mesma forma que me entristecia ver meu melhor amigo mal. Eu não podia permitir que eles se desentendessem. Não por minha causa.

Troquei mensagens de texto com Hoya durante toda aquela tarde. Queria saber o que se passava entre meu casal favorito, e jamais me perdoaria se eles brigassem por minha causa. Hoya disse que Dongwoo estava causando barulho demais por nada em especial, e eu acreditava nele. Lee Howon jamais deixaria Jang Dongwoo por Lee Sungjong, era algo que até Hoonye seria capaz de concordar, ou Woohyun, se não tivéssemos tanto medo de contar-lhe que conhecíamos seus colegas.

Eu detestava aquela situação, tentei convencê-lo de fazermos outra coisa naquela noite, mas Hoya estava decidido a ir ao karaokê. Ele disse que nem tudo acontecia de acordo com nossa vontade, e Dongwoo devia aceitar o fato de que ele também merece ter amigos, independente de sua permissão ou não. Aquilo não soava muito certo, se bem conhecia meu amigo.

Depois de me convencer, Hoya disse que eu deveria ir à casa de Dongwoo pelas oito da noite, e de lá iríamos ao nosso destino final.

Faltando quinze minutos para as oito, estava entrando no quarto de Dongwoo, e tendo outra surpresa – que devo dizer ser muito agradável, em todos os sentidos. Hoya estava sobre a escrivaninha de Dongwoo com suas pernas enleadas ao redor dos quadris de meu amigo, que o beijava intensamente. Eu podia ver os dedos de Hoya roçarem a nuca, perderem-se entre os fios desbotados de Dongwoo, o que parecia aprofundar o beijo deles. Aqueles dois eram como duas peças que se completavam, se encaixavam perfeitamente.

Me detive junto à porta, e me permiti observá-los. Não porque era prazeroso vê-los – o que me fazia acreditar que a cada dia eu tomava gosto por ver casais se engalfinhando em beijos – mas porque eles pareciam perfeitos um para o outro. Se alguém torcia por aqueles dois, esse alguém certamente se chamaria Kim Sunggyu. Notei que a mãe de Dongwoo se aproximava, e me meti dentro do quarto, batendo a porta à minhas costas, assustando os dois.

“Puta merda, Gyu, você quase me matou de susto!”

“Desculpa.” Disse sem jeito, sem saber para onde olhar. Eu provavelmente estava completamente vermelho. “Mas eu não tenho culpa se vocês…”

“Hyung, você veio!” Hoya desceu da escrivaninha e veio em minha direção com um sorriso reconfortante nos lábios. Me sentia mais tranquilo. “Eu sabia que posso convencer qualquer pessoa.”

“Só não se aproveite disso.” Dongwoo disse sério, se unindo a nós. “Vamos logo, assim tudo acaba mais rápido.”

Seguimos os três em direção ao karaokê, que não ficava muito longe dali. Nas ruas escuras, Dongwoo costumava buscar as mãos de Hoya, entrelaçar seus dedos, trazê-lo para mais perto. Eu achava tão encantador aquele gesto, como se um dissesse ao outro que pertenciam juntos, que nada poderia separá-los. Me perguntava se algum dia eu encontraria alguém para mim. Se Woohyun poderia se transformar nessa pessoa.

No karaokê, encontramos Sungjong e outros garotos da sua idade. Myungsoo e Sungyeol não apareceram antes das dez da noite. O garoto nos fez companhia enquanto os outros cantavam e bebiam, o que achei muito gentil da parte dele. Dongwoo, no entanto, não descolou os olhos de Sungjong. Depois de algumas latas de cerveja, ele se tornou ainda mais possessivo, sem se importar com as pessoas que torciam o nariz ao vê-lo abraçar e beijar Hoya.

Sungjong evitava olhar para os dois, era como se sua proximidade fosse ofensiva aos seus olhos. No entanto, a pessoa que sobrava – no caso, eu – era quem tinha a maior atenção do garoto. Sungjong me oferecia bebidas, me chamava para cantar consigo, balançava meus braços enquanto os amigos dele cantavam animadamente, e eu estava me cansando de toda aquela cena. Ele só se comportou como um garoto quando o irmão mais velho chegou.

Quando Myungsoo e Sungyeol chegaram, Sungjong ficou inquieto. Ele fitava os dois, voltava a encarar Hoya e Dongwoo que conversavam como dois amigos no sofá, me olhava como se se sentisse perdido. Tentei acalmá-lo, mas parecia mais difícil do que havia calculado.

“O que houve, Sungjong?”

“Nada, hyung.”

“Tem certeza?” Insisti, vendo-o estalar os dedos.

“Absoluta.”

“Não minta, Sungjong. Não te conheço direito, mas você está agindo de forma estranha.” O peguei pelo braço, e ele franziu o cenho, parecia um gatinho emburrado.

“OK.” Ele suspirou, sentando-se ao meu lado. “Myungsoo disse que não devia ter convidado vocês. Acho que ele está bravo comigo.”

“Por que você leva tanto em consideração o que o Myungsoo pensa?” Perguntei como se fosse amigo de longa data de todos eles.

“Bem…” Sungjong mordiscou o lábio inferior e, não fosse pelas luzes, podia jurar que ele estava ruborizado. “Myungsoo é um hyung que eu respeito muito. Me sinto mal deixando ele irritado.”

“Mas o que nós fizemos pra ele, pra se irritar com a nossa presença?”

“Myungsoo hyung fica nervoso quando meu irmão se irrita demais… E ultimamente Sungyeol hyung anda muito irritado.” Como uma luz no fim do túnel, tudo se iluminava em minha mente. Não era mentira, já que eu vira aquele garoto mais de uma vez diante do portão de Woohyun, com a mesma expressão.

“E você sabe por que ele fica irritado?” Tentei jogar o verde para colher o maduro, e por sorte Sungjong parecia bêbado e fácil de enrolar.

“É tudo culpa do Woohyun hyung… Tudo culpa dele.” Sungjong vacilava enquanto falava, e, quando mencionou Woohyun, sua voz parecia ainda mais fraca. O que Woohyun teria feito para irritar Sungyeol? As informações lentamente se encaixavam, e tudo o que eu queria era que Dongwoo olhasse em minha direção, assim o chamaria e ele ouviria também.

“O que Woohyun fez?”

“Brigou com Sungyeollie hyung e Myungsoo hyung. Não sei exatamente o que fez os dois brigarem, mas foi feio. Sungyeol hyung foi suspenso por uma semana, Myungsoo quase foi expulso do colégio e os pais do Woohyun transferiram ele de escola e abriram um boletim de ocorrência. Disseram que se eles chegassem há cem metros de distancia do Woohyun hyung, eles processavam nossa família.”

“Como assim?” Me sentia confuso e nauseado. O que podia ter causado tudo aquilo?

“Eu não sei hyung, eu não…” Antes que ele pudesse responder, Sungyeol se aproximou e o segurou pelo braço, puxando-o.

“Eu já disse pra não se meter com esses caras, Sungjong-ah!”

“Hyung, eu só quero fazer meus próprios amigos e parar de ser sua sombra.” A voz de Sungjong era tão áspera, que por um segundo, senti pena dele. O garoto só queria ter amigos, e Dongwoo com ciúme dele.

“Cala a boca, Sungjong!” Ele o empurrou para longe e cruzou os braços, me encarando. “Você não é bem vindo aqui. Nem você nem seus amigos, então vão embora.”

“Desde quando você é dono do karaokê?” Me levantei, aproximando-me dele. O que aquele cara havia feito realmente me dava nos nervos.

“Eu não sou dono do karaokê, mas sou dono dessa festa. E você não foi convidado. Então saia agora antes que eu chute sua bunda até você ficar bem longe daqui!”

“Eu não vou fazer o que você quer, seu merda!” O empurrei, e o sentido de alerta de Dongwoo provavelmente fora ativado, já que ele havia prontamente se metido entre nós dois.

“Você não vai brigar aqui, Sunggyu-ah” Dongwoo me segurou, me empurrando para fora do karaokê. Hoya se despediu de Sungjong e pediu desculpas, e logo nos seguiu. “Perdeu a noção do perigo, Sunggyu? Se você briga com esse moleque aqui, vai virar notícia e vai acabar nos ouvidos do Woohyun. É isso que quer? Estragar tudo?”

Ele tinha razão. Às vezes a sabedoria e tato de Dongwoo me surpreendiam, ele parecia um idiota na maior parte do tempo, mas bem no fundo ele era um gênio.

Contei a eles tudo o que ouvira de Sungjong, e as dúvidas de Hoya pareciam se tornar certezas a cada nova informação que coletávamos. Myungsoo e Sungyeol pareciam definitivamente um casal, os olhos de águia de Dongwoo não deixaram um pequeno detalhe passar. Ele os vira de mãos dadas quando chegaram, a forma como Myungsoo falava ao ouvido de Sungyeol, como apoiava o queixo em seu ombro, como sorria para ele denunciava que eles não eram apenas amigos.

Mas onde Woohyun se encaixava nessa história? Nós ainda precisávamos descobrir.

O final de semana se arrastou lentamente, mesmo que só precisasse esperar que domingo acabasse para voltar a ver Woohyun. Na segunda de manhã, nos encontramos em sua esquina, como era de nosso novo costume, e conversamos como sempre fazíamos. Ele me contou sobre seu almoço em família no sábado, sobre como sua mãe parecia mais calma e menos tensa quando todos estavam em um lugar diferente, e meu coração se aqueceu com as boas notícias.

Eu tentava esquecer o que havia acontecido no sábado à noite, pois não queria soltar, sem querer, qualquer informação desnecessária. Woohyun não merecia aquilo, não merecia que eu e os outros fossemos uns traidores que não mereciam sua consideração. Quando eu tentava descobrir o que aconteceu para que ele fosse transferido e sua mãe proibisse que socializasse, eu queria poder ajudá-lo de alguma forma, não fazer fofocas a seu respeito.

Qualquer coisa era facilmente esquecível quando ele estava ao meu lado. Como me lembrar do mundo lá fora, com todas aquelas coisas acontecendo dentro de mim, enquanto o olhava falar, sorrir, fazer seus aegyos bobos e falhos? Woohyun tinha o poder sobrenatural de me mover para outro mundo, um mundo onde tudo recendia ao seu perfume, onde tudo soava como sua voz, seu riso. Um mundo onde Woohyun era tudo ao meu redor.

Tal afirmação era confirmada pelo fato de que eu não havia notado que já chegávamos à escola. Tentei disfarçar minha expressão de surpresa, e ele me empurrou em direção à sala de aula, animado, ansioso por encontrar Dongwoo.

Aquela segunda fora sucinta, com exceção de um momento.

Depois do treino, quando todos se retiraram para o vestiário e Woohyun continuou nadando, eu me sentei à beira da piscina e me pus a observá-lo. O via nadar com dedicação, como se faltasse apenas um minuto para nossa competição. Podia notar o quão cuidadoso ele era, como se dedicava a suas atividades, desejando ser nada menos que o melhor no que fazia. Tal qualidade me fazia ainda mais encantado por si.

Ele notou minha presença e nadou até mim, impulsionando seu corpo para fora da piscina, e se sentou ao meu lado. Sorri para ele, e ele retribuiu o gesto de forma diferente. Woohyun parecia receptivo, não sei explicar. Seus olhos estavam tão enegrecidos, que sentia como se eles atraíssem os meus lentamente.

“Por que não foi pra ducha com os outros?” Ele perguntou, movendo os ombros e apertando os lábios, fazendo com que suas covinhas aparecessem. Ah, seu aegyo.

“Os outros alunos estão lá, não gosto muito quando fica lotado. Só sai besteira daquele vestiário.”

“Eu também não gosto.” Ele concordou, e observou a água se mover em pequenas ondas.

“Por isso ficou aqui nadando?”

“Er… Digamos que sim.” Woohyun respondeu, tencionando os ombros e soltando um grunhido que eu cria ser uma forma de expressar seu constrangimento. E então, ele me fitou.

Não como os olhares que ele direcionava a mim quando estávamos entre os outros. Era um olhar profundo, intenso, que rasgava minha pele e adentrava minha alma.

Woohyun inclinou-se em minha direção, o sorriso ainda brincava em seus lábios. Nenhuma palavra fora dita, tampouco ouvida. Acredito que não havia qualquer necessidade. Eu não sabia se aquele era o sinal, se havia alguma regra, um clima por acontecer, eu só sabia a respeito da forma como meu coração batia descompassado, perdido, atordoado. Como se me implorasse que me movesse, me aproximasse, mantivesse meus olhos presos aos dele.

Muitos dizem que nossos sentimentos estão ligados à mente, que a função do coração é apenas bombear o sangue que nos mantém vivos, mas não havia outra explicação para a forma como ele dançava em meu peito. Me dava coragem, me fazia desafiar meus limites, minhas barreiras.

Eu, que pensava que meus pés seriam os que me fariam escalar a macieira, que minhas mãos seriam aquelas que colheriam a maçã no topo da macieira. Ah, como eu era tolo. Meu coração, que subia até a boca num pedido emudecido e apaixonado, impulsionava meus membros, meu corpo, minha vida em direção a Woohyun.

E meus olhos pesavam, semicerravam-se lentamente ao sentir a respiração adocicada de Woohyun resvalar em meu rosto. Fitavam os lábios avermelhados, levemente molhados, diziam ao que restava de mim que me faltava pouco. O vi sorrir, seria aquele outro sinal? A ponta de nossos narizes roçavam-se sutilmente, e logo nos tocamos.

Nossos lábios se tocaram levemente, e eu podia senti-lo estremecer sob aquele gesto – ou era eu quem estremecia à menor menção de tê-lo tão perto? Era apenas um roçar, um selar de lábios que era o meu primeiro. O primeiro beijo que eu dera em toda minha vida. Senti Woohyun inspirar, roubar meu ar sem ao menos mover seus lábios, e então eu voltei a mim. Nossos olhos se encontraram novamente, e eu não sabia dizer o que via nos dele.

Eu não precisava entender o que acontecia naquele momento. Apenas acontecia. Eu finalmente havia tocado minha maçã. Minha preciosa maçã.

Que tal mandar um alô pra tia Suz? xD